Bate bola, jogo rápido. Melhor filme? Melhor diretor de cinema (você consegue algo melhor que Tarantino só pra parecer cult)? Melhor banda? Melhor música para término de relacionamento? Um livro da adolescência? Uma viagem de carro? Algodão doce te remete à? Eu por exemplo, às vezes o cheiro de pão de forma com presunto me remete à San Bernardino, CA, julho de 1998. A minha host mother, Armida, fazia um lanche assim pra eu levar no almoço do curso de inglês. Já o Bobby, filho da família, gostava de futebol e achava que eu jogava, quando eu queria era jogar baseball com ele porque pra mim era diferente. Mas a referência dele era Brasil - futebol.
Referência não se ensina. Você pega. Nas entrelinhas. Vai vendo. Vai apreciando, vai consumindo. Uma hora aquilo faz parte de você. É você.
É claro que muita coisa você estuda, você aprende. Quem já passou por uma faculdade já precisou em algum momento de referências bibliográficas. Pois é. Mostrar depois do seu trabalho pronto quais foram as suas referências. Quem te inspirou a escrever. E ao longo do texto indicar cada uma individualmente. E se escrever palavra por palavra, melhor colocar entre aspas. Referência não é plágio. Às vezes pode ser homenagem.
Essa é Approaching Shadow, do Fan Ho:
Essa é a minha homenagem fofa com meu filho, João:
E essa é uma inspiração durante o meu ensaio com a Larissa:
Outro dia a talentosíssima Ju Kneipp tava falando sobre isso. Não tem como ensinar ou dar referências de certas coisas que as pessoas precisam passar. Eu até comentei no post dela no instagram e ela repostou. Tendo a ser participativo.
Tem um vídeo já conhecido de uma entrevista do Denzel Washington quando lhe perguntam se um diretor branco conseguiria ter dirigido o filme "Um Limite Entre Nós" (Fences), que ele dirigiu. Ele responde, "não é sobre cor, é cultura". Ele comenta que quem é negro sabe o cheiro de uma escova alisando cabelo num domingo de manhã. No caso dele, ele depois explica que isso lembrava ir à igreja. É uma diferença cultural. É uma referência.
E você tem que viver, passar por aquilo de alguma maneira pra fazer sentido.
Você tem que ouvir, tem que ver, tem que ler, tem que assistir e depois, só depois, aquilo se internaliza e vira referência. Você simplesmente precisa viver. E depois, quando você vir de novo aquela cena que você já viu antes, você enxerga. É como essa sombra de Approaching Shadow, do Fan Ho. Sem a referência você não enxerga. É só uma parede e uma sombra qualquer. Com a referência seu olho brilha.
Outro dia, durante um ensaio de família, Francisco (4 anos) pediu para eu guardar a câmera e brincar. Como meu filho João às vezes pede quando estou com celular. Eu desliguei e coloquei na mesa. E brinquei com ele. Sim, existe uma prestação de serviço de fotografia que precisa ser entregue. Mas existe a conexão. A maneira que a criança vê o mundo, que quem convive com criança sabe. Outros poderiam ficar constrangidos, não querer parar.
A referência é aquilo que te toca. E quando você pede pra alguém uma referência de qualquer coisa, você está querendo transferir a intransferível sensação que aquilo causou no outro. Pra você, pode ser que seja só uma sombra na parede.
* entrevista do Denzel [https://www.youtube.com/watch?v=9Ayf8Iny9Eg].